«Os loucos e arrogantes traidores da Pátria»

Acreditam que estão a defender o futuro da língua portuguesa. Estarão?

Ao defender o AO, acreditam que estão a proteger o futuro do idioma português e a assegurar a sua projecção no planeta. Têm uma relação “tu cá tu lá” com o estudo da língua portuguesa: são professores universitários, ensaístas e linguistas. Apesar das controvérsias, vêem finalmente o AO em vigor, desde o passado dia 13 de Maio.

«Os loucos e arrogantes traidores da Pátria»
(fonte: ionline)

Pedro Dinis Correia

Também linguista, Pedro Dinis Correia, é mais um dos defensores do Acordo. Juntamente com o professor João Malaca Casteleiro, é autor da obra, “Actual, o Novo Acordo Ortográfico”, que resume “de forma clara e sucinta quanto possível, as modificações do Acordo Ortográfico de 1990. 

Este, pode ler-se na sinópse da obra, “apenas afecta a grafia da escrita e não interfere de modo nenhum nem nas diferenças orais, nem nas variações gramaticais ou lexicais”. É também autor de um dicionário prático segundo as novas regras. Pedro Correia organizou em Lisboa, conjuntamente com o professor Malaca, um curso de formação na nova ortografia.

Malaca Casteleiro

João Malaca Casteleiro, nascido em Teixoso (Covilhã), a 29 de Agosto de 1936, licenciou-se em Filologia Românica, em 1961. Doutorou-se pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em 1979, com uma dissertação sobre a Sintaxe da língua portuguesa, onde é professor catedrático desde 1981. 

É membro da Academia das Ciências de Lisboa e foi o principal responsável na elaboração do Novo Acordo Ortográfico de 1990, aprovado em Outubro e Dezembro desse ano em reuniões em Lisboa, com a participação de representantes dos sete países lusófonos de então, acordo esse que apenas entrou em vigor este ano. É ainda Investigador do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, integrando-se no grupo “Multiculturalismo e Lusofonia de Política de Língua Portuguesa”.

O conceituado linguista vê no Acordo Ortográfico a possibilidade de projecção internacional da língua portuguesa, através da junção das duas grandes normas oficiais de ortografia que divergem entre si – o português e o brasileiro. “O problema começou em 1911, quando Portugal fez a primeira grande reforma da língua sem consultar o Brasil. A partir daí criaram-se duas ortografias que ao longo do século XX se foram distanciando, apesar das várias tentativas de unificação”, diz ao i. 

Tentativas de acordos que pressupunham uma unificação completa da língua, explica, algo que não é possível, como se veio a verificar. Agora, o objectivo é unificar “tanto quanto possível” a pensar no futuro da projecção da língua portuguesa no mundo. “É um acordo a pensar no futuro”, assegura.

O professor universitário, que foi redactor da Nota Explicativa do Acordo Ortográfico, admite que não há nenhum acordo perfeito e reconhece que existem imperfeições neste. Em todo o caso, recorda que sempre existiram e sempre hão-de existir duplas grafias e fonéticas, mesmo em Portugal (“toiro – touro”; “oiro – ouro”, por exemplo). Como também existem divergências na língua inglesa, entre o americano e o britânico. 

O que está em causa é a unificação da ortografia e não da pronúncia, essa é “muito difícil de conciliar”. Sem a aprovação deste acordo, em 1990, Malaca considera que se corria o sério risco de termos hoje oito ortografias diferentes, depois do processo de descolonização e de, consequentemente, a língua portuguesa deixar de ser das mais faladas do planeta. 

E é com muito orgulho que diz que há “250 milhões de pessoas a falar português”, que é falada em quatro continentes e que é mesmo o idioma mais usado no hemisfério sul. Salientando que já há muitos professores universitários, centros de investigação e jornais a colocar em prática a nova ortografia, encara com optimismo a mudança e diz que os mais jovens estão a aprender “sem qualquer problema”. 

Para os mais velhos diz que é uma “questão de hábito” e de se repensar mentalmente a ortografia das palavras até ser algo automático. E sublinha que o Acordo - “que não é uma reforma” - não desvirtua o passado e foi feito a pensar sobretudo no futuro e na economia.

Malaca Casteleiro, que é autor de vários dicionários de língua portuguesa, comenta ainda que, no que diz respeito à supressão das consoantes mudas (“facto – fato”, “óptimo – óptimo”, “aspecto – aspeto”) – algo que tem sido muito criticado – “é mais fácil suprimir uma consoante da escrita a quem a pronuncia, do que colocá-la na escrita de quem não a articula”. O professor finaliza a conversa perguntando-nos: “E no i vão começar a usar o Acordo?”

Fernando Cristóvão

Fernando Alves Cristóvão, que usa o nome literário de Fernando Cristóvão, foi Assistente do escritor Vitorino Nemésio na Faculdade de Letras de Lisboa, tendo-lhe sucedido na Cátedra de Literatura Brasileira. Foi Presidente do Instituto de Cultura e Língua Portuguesa - ICALP -, actual Instituto Camões, e é membro da Academia das Ciências de Lisboa. 

Pertence ainda a várias instituições científicas nacionais e internacionais e actualmente integra a Comissão de Avaliação Externa das Universidades Portuguesas. Foi professor visitante e conferencista em várias universidades estrangeiras -Rio de Janeiro, Salvador da Bahia, Brasília, Rennes, Utrech, Colónia, Pequim e Seul. 

Dirige uma equipa de investigadores na área de “Literatura e Cultura” do Centro de Literaturas de Expressão Portuguesa da Universidade de Lisboa, da Faculdade de Ciências e Tecnologia, privilegiando as temáticas brasileira e de literatura de viagens. 

É Presidente da Associação de Cultura Lusófona, sediada na Faculdade de Letras de Lisboa, onde prepara, com uma equipa, o Dicionário Temático da Lusofonia. Linguista, aceso defensor da nova ortografia, disse ao jornal “Público”, em resposta àqueles que encaram o acordo como uma cedência ao Brasil, que “as mudanças que se fizeram com este acordo já tinham sido reclamadas em 1746 pelo português Luís António Verney”(que na sua obra ‘O Verdadeiro Método de Estudar’ defendia que os portugueses deviam escrever a língua exactamente como a pronunciam). 

Cristóvão também é apologista da ideia de aproximar a ortografia da pronúncia, mas se mudar a primeira é possível, a segunda nem tanto, dada as complexas diferenças linguísticas dos vários países da CPLP.

Carlos Reis

Ensaísta e professor do departamento de Línguas, Literaturas e Culturas da Universidade de Coimbra, é natural de Angra do Heroísmo, nos Açores. Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas pela Faculdade onde é hoje professor de Teoria da Literatura, Teoria da Literatura Comparada, Introdução aos Estudos Literários e Literatura Espanhola (moderna e contemporânea) nesta Universidade antes de 1975, foi também o responsável pela cadeira de Literatura Portuguesa (moderna e contemporânea) e um dos fundadores da Universidade Aberta, criada em 1988. 

Carlos Reis, especialista em Eça de Queirós, tem sido um dos maiores defensores do Acordo Ortográfico de 1990. Para o professor, a resistência ao acordo prende-se com uma questão passional. Em entrevista ao “Expresso”, defendeu que o Estado deve “estabelecer” as regras da língua, porque “se assim não fosse as gramáticas, dicionários ou prontuários ortográficos perderiam qualquer sentido. 

A sua existência, associada ao ensino regido por programas que o Estado aprova, confirma que a língua é um sistema comunicativo complexo que, sendo aberto a derrogações que vão sendo introduzidas pela prática corrente e pela criação literária, não passa sem regulação”. 

Na sua opinião, o Acordo Ortográfico traduz essencialmente um propósito político de conferir ao idioma a unidade possível, esbatendo as diferenças na escrita. Aliás, “não temos de falar como os brasileiros, o acordo é sobre ortografia”, ressalvou.

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