Árvores mais antigas de Portugal


foto: Pedro Nuno Teixeira Santos, arvores-do-sul.blogspot.pt

Tem dois mil anos, é uma oliveira e vive no Algarve.
São um repositório genético único. Em Portugal, há pelo menos seis com dois milénios. Fomos conhecer uma das mais velhas do país.

Viu os mouros chegarem e instalarem-se por toda a Península Ibérica. Ouviu ao longe D. Afonso Henriques conquistar territórios e fundar um país, do Minho até Beja. Testemunhou, cerca de cem anos mais tarde, a derradeira expulsão dos mouros do Algarve, o último pedaço a tornar-se Portugal. 

Aquela que é considerada das árvores mais antigas do país, uma oliveira, tem mais de dois mil anos e foi plantada no tempo dos romanos, tinham eles chegado à Península Ibérica uns 200 anos antes. Tivesse Jesus Cristo andado no Algarve e podia tê-la conhecido.

O tronco cresceu, cresceu, cresceu, e retorceu-se e ficou oco. Uma fenda entre duas pernadas é um convite a admirá-la por dentro. Uma mesa e banco, feitos de madeira (será da própria?), aguardam as risadas das crianças e a curiosidade dos adultos, se estiverem dispostos a um pouco de contorcionismo.

No seu interior oco, a brisa não é já tão fria, o sol atravessa orifícios ovais e traça raios luminosos no ar, como nos vitrais de uma catedral. Ao olhar para cima, destaca-se um tronco, a parte central da oliveira, já morto. As pernadas balançam empurradas pelo vento e os pássaros entretêm-se a chilrear escondidos entre a folhagem viçosa.

Os barulhos da civilização, carros que chegam ao aldeamento turístico onde se encontra no Algarve e até aviões, parecem mais distantes. O interior da árvore é como um casulo.

Em dois milénios, deve ter escutado muitas conversas, passado por provações e dado de comer a muita gente com as suas azeitonas e o azeite que delas produziu. Muita gente deve ter alumiado também. 

A que doenças e pragas sobreviveu? A quem deu sombra e encosto? Por sorte, não houve incêndios que a destruíssem, nem ninguém que a cortasse ou podasse a ponto de a matar.

Faz agora sombra a algumas moradias, caiadas de branco, portadas das janelas abertas, mas sem ninguém que responda ao toque da campainha, no aldeamento turístico de Pedras d"el Rei, na freguesia de Santa Luzia, a poucos quilómetros de Tavira. 

A praia do Barril, na zona lagunar da ria Formosa, fica em frente.

Por companhia, tem outra oliveira e uma alfarrobeira. Só ela, no entanto, tem direito a uma placa informativa: lê-se que a oliveira bimilenar, "o ser vivo mais antigo de Portugal", foi classificada como uma árvore de interesse público em 1984.


Em floração

Miguel Rodrigues, professor de Ciências Naturais na Escola Engenheiro Duarte Pacheco, em Loulé, já visitou a oliveira de Tavira algumas vezes. Até já a mediu.

Ele e um amigo, Pedro Santos, licenciaram-se em Biologia e, já como professores no Algarve, começaram à procura de árvores monumentais em 2006. O resultado foi a criação da Associação Árvores de Portugal em 2009. 

Conseguiram já que a AFN classificasse algumas, e agora o projecto é avançar para todo o país. "Há pessoas que nos dizem: "Ah, lá vêm os maluquinhos das árvores.""

De roda da oliveira de Tavira, Miguel Rodrigues aponta as suas particularidades. "Tive de ir lá para o fundo para a pôr toda na fotografia." Não é para menos: na base do tronco, o perímetro atinge 11 metros e, à altura do peito, é de 7,74 metros. 

"Quando estamos debaixo de uma árvore monumental, temos a sensação de uma presença poderosa." Em altura, passa os dez metros.

Na placa ao lado da oliveira está escrito que são precisos cinco homens para a abraçar. Serão mesmo? Funcionários do aldeamento abraçam-na agora, para confirmar: afinal, só com seis pessoas se completa o abraço. 

"Tenho familiares habituados a trabalhar com oliveiras e, quando vieram cá, ficaram impressionados. Nunca tinham visto nada assim", conta Sérgio Santos, o chefe da recepção, um dos que abraçam a oliveira. "O que mais admiro nesta árvore é a maneira como envelheceu: ter ficado oca no meio. O tronco principal abriu-se e é como se tivesse duas pernas."

Por estar oca, os anéis mais velhos perderam-se, pelo que não poderá datar-se através do seu crescimento, nem extrair deles dados sobre o clima ou a poluição de outrora. Mas o que pode ter de especial para a ciência uma árvore antiga?

Rui Malhó, biólogo da Faculdade de Ciências de Lisboa, diz que o maior interesse está na sua genética: à medida que se seleccionaram as oliveiras, para produzir mais, por exemplo, elas foram perdendo diversidade genética. 

Em caso de uma doença ou condições ambientais difíceis, as oliveiras, ou outras árvores antigas, são um reservatório genético a que pode recorrer-se: "Podem ser uma base genética importante para complementar variedades que já perderam a capacidade que os seus antepassados tiveram de resistência a doenças. Pode-se agarrar nessas plantas mais antigas e ver os genes que expressam [entram em acção] quando há uma infecção."

Apesar de ser um verdadeiro arquivo genético, nem por isso esta oliveira tem recebido muita atenção dos cientistas - que preferem plantas mais fáceis e rápidas de estudar. O certo é que a decana das árvores portuguesas, a três passos da piscina, dos campos de ténis ou de lojas do aldeamento, ainda dá azeitonas. E a prova, discreta, está nas suas pequenas flores.
Por Teresa Firmino (publico) adaptação Pg

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